Semana passada aconteceu o anúncio anual do Prêmio Nobel - um pouco mais sobre o prêmio pode ser lido aqui. No grosso, além da imortalização do seu nome nos anais da história, de ganhar um milhão de dólares e ser convidado a peso de ouro para dar palestras mundo afora, ainda se ganha carta branca pra falar besteiras por aí, mesmo antes de esclerosar - vide o Luc Montagnier que passou a pregar sobre a memória da água.
Mas o que chamou atenção dessa vez não foi o prêmio, mas algumas reações; uma especificamente. Entendamos o caso.
O Nobel de medicina foi para um sujeito que desenvolveu a fertilização assistida - e ficou conhecido como o "Pai" dos bebês de proveta. No início foi um estrondo. Dizia-se que seria possível escolher o sexo do bebê, as características físicas... tudo bobagem. Apesar de ser possível distinguir espermatozóides X e Y, a coisa não é como escolher entre torta de morango ou chocolate. Mesmo assim, foi um enorme avanço, em dois itens dignos de nota: em primeiro lugar, as técnicas de manipulação e conservação de células foi um passo importantíssimo para o domínio atual de engenharia de tecidos e pesquisas em células-tronco (só isso); em segundo lugar, pelo alívio de um sofrimento psicológico absurdamente intenso, que é a dificuldade/impossibilidade da maternidade. Muitos casais que não podiam ter filhos estavam aprisionados num pesadelo depressivo - e eu não vou explorar as dimensões psicossociais do caso, mas não é difícil pensar no quão catastrófico isso pode ser para um casal, a mulher principalmente.
É óbvio então que os avanços propiciados pela pesquisa nesse campo são sensacionais - seja para a fecundação assistida, mas ainda mais para os enormes potenciais das células-tronco - e sem sombra de dúvida, se causa diminuição do sofrimento humano, é bom, não?
Não para a santa madre igreja.
Imediatamente após o anúncio do Instituto Nobel, as cornetas do Vaticano ecoaram mundo afora. Condenaram a premiação de algo anti-natural, que viola as leis do chefão deles, e toda a pantomima que costuma empestear manifestos dessa natureza. A notícia pode ser lida aqui, e a repercussão aqui. O absurdo dessa situação é tal que só pode ser comparado aos absurdos típicos proferidos costumeiramente por eles mesmos - do não uso de preservativos, do não uso das células tronco.
A ironia disso tudo é que a crítica deles faz todo sentido. Se a ciência for capaz de aliviar os sofrimentos humanos, prover conforto para aflições físicas e as explicações para o funcionamento do mundo material, pra que então serve a igreja? Já que o chefe deles só se ocupa das aflições da alma, então que não metam colheres eclesiásticas no caldo alheio.
10 comentários:
Eu não sei o que é pior religiosos que não aceitam a ciência ou cientistas que não admitem crenças. Ambos se irritam, e ao meu ver,ambos têm mente limitada, pra não dizer preconceituosa.
Acreditar em Deus não significa anular a ciência, achar que ela é coisa do demo, ou algo parecido. Se as pessoas percebessem isso, nem os cientistas se zangariam com os religiosos e vice e versa.
Deixo bem claro que não acredito que todos sejam assim.
O premio Nobel já se desmoralizou, então o que falarem dele já se presume ser bobagem.
A fertilização in vitro já acontece a muito tempo utilizada em pesquisas a mais tempo ainda e só agora a reconhecem como um grande avanço da ciencia? Pior, só agora a igreja é contra? Quer dizer se nem dessem o nobel a igreja nem ia criticar? Bizarro e sem qualquer fundamento.
Já achei tambem palhaçada o que fizeram com Mario Vargas Llosa, o cara é genial e escreveu numa epoca de politica tensa no Chile, e agora que ele já parou de publicar a um tempinho é que resolvem dar um premio? Ridiculo.
O Nobel já teve prestígio, agora é só um clube que nomeia quem quer, e quando quer, não mais quem realmente merece.
Caro(a) Anônimo(a)
Tenham suas religiões e crenças. Mas que não metam a colher onde não lhes compete. Acreditem no que quiserem, cientistas ou leigos, mas usar uma coisa pra outra e outra pra uma é que não dá certo nunca. Por que então os religiosos ficaram zangados com as descobertas científicas? Então, tenho sim o direito de ficar zangado com a colherada deles na ciência.
@V. O Nobel continua cobiçado e desejável. De fato, a coisa é bem mais política do que mérito.
Porque eles ficaram zangados também não entendi.
E concordo: não da pra explicar crenças com ciência nem o contrario.
Eu vejo a coisa assim: a ciência vai contra os desígnios de deus? Oras, os seguidores de deus, da religião, ideologia... não são obrigados a utilizar daquelas técnicas/descobertas. Qual o problema de deixar cada um escolher se vai ou não "arder no inferno"?
E pq a igreja é contra? Porque o domínio de técnicas como esta diminue a "onipotência" do seu deus. Simples assim.
Uma questão de vaidade, poder e manipulação. Desprezível assim...
Essa briga entre ciência e religião não traz nenhum tipo de benefício para ambas as partes. Concordo com Montagna quando diz que cada coisa tem o seu lugar. O problema, na minha opnião, e nem sei se 'problema' é a palavra certa, mas é que a igreja/religião ainda interfere muito em todos os aspectos da sociedade, já entrando em outras discussões. O que deveria acontecer é essa separação, de fato, das partes. Ambas são importantes, para quem acredita, é claro.
@Montagna: O nobel nunca deveria ser politizado e no momento que fosse deveria cair no descrédito do meio cientifico e ter acabado. Mas sinceramente achei sacanagem o que fizeram com o Llosa não acha?
@V.
Acho que todo tipo de prêmio como o Nobel é politizado. Na verdade, são declarações de importância reconhecidos por um número expressivo de cientistas do mundo todo. É notório que tenha havido injustiças - o caso do Carlos Chagas e tantas outras - mas é um por ano, e obviamente há muito mais feitos importantes do que apenas um por ano. Por outro lado, acho corretíssimo o que aconteceu com o Robert Gallo ao ser deixado pra fora do Nobel quando o Luc Montagnier ganhou - o Gallo foi pilantra - e a academia, num ato político, deixou claro que entendeu isso dessa forma. Assim, dentro do mérito científico, não acho que os que ganharam Nobel eram injustos; talvez tivesse sido mais justo ainda que um ou outro ganhassem. Quanto à literatura, não conheço a obra do Vargas Llosa, e nem tenho calilbre intelectual pra dizer sobre o Nobel de literatura. Mas por que sacanagem? Por ter sido tarde? Antes tarde do que nunca!!!
Fala galera!
Bom, com relação ao fato de instituições religiosas meterem o dedo na ciência, e vice-versa, discordo, também, porém em conversa com um amigo, é muito claro que quanto mais a ciência cresce e avança, mais valores morais e éticos tendem a cair pela imposição de um novo pensamente que pode ser testado e manipulado, porém essa briga é, na essência, irrelevante, pois ciência deve ser tratada como ciência e crenças como crenças. A ponto maior de toda a discussão fica no ponto em que valores estão sendo invertidos, o que traz o embate direto entre ciência e religião. Quanto ao Nobel, também acredito que o mesmo tenha adquirido mais um caráter político do que científico, propriamente, vejam o caso do físico brasileiro César Lattes: o cara foi de suma importância no trabalho sobre méson-pi e não recebeu o prêmio pois seu colega de pesquisa havia falecido e o prêmio não poderia ser póstumo, mas ficou super claro que o prêmio não foi para esse trabalho dada a naturalidade do pesquisador!
Postar um comentário