terça-feira, 26 de outubro de 2010

Por que a coisa vai mal, parte II

No outro post, metemos o pau nas falhas da educação. Coisa séria, e não deve ser negligenciada quando pensamos nas coisas que vemos cronicamente erradas. Mas, a mãe de um amigo costumava dizer que a cultura amansa o ser humano. E concordo com as palavras dela. Só educação não basta, ou pelo menos, a cultura faz parte da educação. Instrução apenas é quase como adestrar animais... como se estivéssemso muito longe disso.

Nem preciso dizer que não fui surpreendido pela notícia de que não se consome cultura em São Paulo - pode ser visto nesse link aqui. Shoppings sim. Cultura não. Cultura não é uma coisa que se possa exibir; é pedante, não? Sendo assim, queremos coisas. E continuamos ignorantes e semi-selvagens. Como a instrução sozinha não garante educação, e sem cultura não temos educação, preciso comentar algo mais sobre o estado lamentável em que se encontram as coisas?

Não sou fã de teatro. Vi meia dúzia de peças e acho meio chato. Também admito que não vejo muita graça nos museus de São Paulo - acho que podia ser muito melhor. Mas também admito que sinto falta de um circuito de cinema mais alternativo e um circuito musical mais decente e valorizado; também advogo que há bem mais cultura do que somente shows, museus e cinemas - qual foi o último livro decente que se leu por aí?

Vamos mal... vamos muito mal...

14 comentários:

GaArini disse...

Creio que uma frase do grande cientista Carl Sagan ilustra bem tudo isso: "No futuro, não muito distante, haverá poucos empregos para pessoas altamente educadas e bem preparadas. Não haverá chances para todo mundo. A qualidade do ensino é precária no mundo inteiro e isso terá graves conseqüências. Em especial, a educação científica é deplorável. Em quase todo o mundo os professores ainda são mal remunerados e a qualidade do ensino de ciências é muito deficiente. Para mim, este é um dos piores problemas que enfrentamos atualmente, causador de muitas desgraças. No início deste século, o escritor H.G. Wells dizia que "o futuro será uma corrida entre a educação e a catástrofe". No momento, acho que estamos perdendo a corrida."

montagna disse...

Carl Sagan era fod*** e tenho dito...

GaArini disse...

Concordo contigo Montagna! E o mais foda e triste, diga-se de passagem, é admitir que suas premissas vem se confirmando

V. disse...

Lamentável é o preço médio dos livros brasileiros e o índice de analfabetismo que são um desincentivo à leitura.
Sinceramente acho também um absurdo como as escolas forçam os alunos a lerem clássicos da literatura fastidiosos e não oferecem opções atraentes a leitura. Além de não haver bons livros de escritores brasileiros contemporâneos, somos obrigados a ler os estrangeiros por falta de opção. Longe de mim achar que a literatura estrangeira é ruim, pelo contrario é a unica de qualidade nas nossas livrarias, mas é realmente uma pena...
A falta de cultura começa a afetar a elite intelectual, parece que agora é chique não ser cult.
Quantos de vocês já leram poesia por prazer? Depois de Drummond ninguém mais rima, nem mesmo lê com freqüência jornal. Somos uma raça em extinção e ainda por cima descriminados. E assim ficamos escondidos nos becos da biblioteca, solitários e tristes...

Farmacéptica disse...

É... poucos empregos para "pessoas altamente educadas e bem preparadas" e um mar de diplomados desempregados,não necessariamente bem preparados. Apreciar cultura, mas cultura alto nível mesmo, é caro. Produzir cultura então. Enfim...

Ahhh!, como eu gosto dos becos das bibliotecas... Pode-se descansar os ouvidos, e a mente, da tagarelice cotidiana. ;o)

montagna disse...

@Arini
Ele não era um profeta, era um cientista, e dos bons. Coisa da ciência: previsibilidade.

@V.
Não me escondo, não sou triste, nem por ser solitário (o que é uma maravilha!). A literatura de escola é uma grande bobagem. Sempre perguntei quantos autores de língua portuguesa são relevantes para a aliteratura mundial? Meia dúzia não é um exagero...

@F.
Diplomados ignorantes... isso é o que mais tem. Mas eles mesmos são culpados, pois eles só querem o papel e acham que só o papel resolve alguma coisa. Por mim, que continue assim; fico sem concorrência.

farmacéptica disse...

@M.
Mais ignorância, menos concorrência e, num futuro não tão longe, salários maiores... rsrs
Pra mim tá ótimo!

V. disse...

@M.
Sempre vi a leitura como algo tão unico e tão intrínseco que não deixa de ser solitário. Mas fico triste sim, por que gosto muito de trocar livros e compartilhar experiencias literárias. E é uma pena que não tenha muitas pessoas com esse gosto por ler.
Mas realmente a culpa são desses caras do vestibular que acham mesmo que discutir aspectos filosoficos dos livros vai realmente avaliar um bom aluno. Depois reclamam que ninguem se interessa por ler...
Não estamos aqui para discutir relevancia das obras e sim como os professores não sabem incentivar a leitura de forma atrativa.
Sinceramente que relevancia tem Harry Potter? Não importa, ainda sim amei cada um dos livros da série. ^_^

GaArini disse...

Bom, com relação a abordagem literaria das escolas como um todo, me veio a cabeça um discurso do meu professor de literatura: ele dizia que gostaria de dar aula de trás para frente, ou seja, por que raios pegar uma mulecada de 14~15 anos de idade e enfiar garganta abaixo métrica, rima, cantigas de amigo, escárnio, mal-dizer, com todo aquele requinte e vocabulário ultra-complicado para um adolescente, enquanto poderia começar pelo modernismo (último tema do ensino médio) com toda falta de métrica, temas de um cotidiano não tão distante com assuntos mais atraentes, o que possivelmente estimularia mais o aluno? Tomo o discurso dele, não só para a parte literaria, mas para grade de ciências como um todo: qual o intuito de se explicar ciclo de Krebs para um aluno do nono ano, ao invés de abordar temos como zoologia ou botânica, mais comuns? Enfim, enquanto a grade curricular do ensino de base for algo preso e desistimulante, o ensino superior será um mero reflexo disso, logo temos de avaliar onde está o problema.

V. disse...

O problema é muita matéria, para uma avaliação arbitrária. O vestibular não presa o aluno que compreende e sim aquele que decora a matéria nos mais minuciosos detalhes. Ou seja uma tonelada de matéria esmagando um aluno sem preparo psicologico, para ser previamente descartada.
Por que diabos um engenheiro precisa saber toda evolução de um tecido em feto? Ou um advogado geometria analítica avançada? Mais da metade disso não é usada no curso e a outra metade é reaprendida de alguma forma na faculdade. Totalmente desencorajador e desestimulante, como podemos criar cultura se não há espaço para criatividade e raciocinio?
Realmente não há educação, por que não é um processo conciente. Se não há educação não há a valorização da cultura. Somos como macacos adestrados mas que continuam a ser selvagens. Esse é o ponto em questão, como não ser selvagens nesse ciclo vicioso?

Natália disse...

Não há somente um problema, mas um conjunto deles, e cada um com seu grau de gravidade. Acredito que essa situação não vai melhorar tão rápido. Talvez quando eu tiver meus netos [!] isso ainda seja um grande obstáculo na educação.
Com relação a quantidade de matérias, discordo de @V. Acho que é necessário conhecer todas as áreas, pois se focarmos somente naquela a qual nos interessa, só saberemos daquela. Seriamos pessoas de um assunto só. Acredito que uma pessoa precisa saber opinar, ou pelo menos ter uma idéia sobre variados assuntos. Talvez a maneira como são aplicadas as matérias é que causa esse desestimulo. E com isso, a cultura se esvai.

V. disse...

@Natália
Eu não disse que não devemos conhecer de tudo e sim que não é necessário se aprofundar tanto. Penso no modelo alemão que no colegial você diz que área quer seguir e se direciona melhor pra ela, mas não deixa de aprender o básico das outras. Já o colegial brasileiro propõem aprofundamento em tudo e não capacita uma especificidade. Foi como eu disse por que devemos aprender geometria analítica quando só polinômios já são interessantes para ciências biológicas? O resto vamos aprendendo na faculdade. Penso ainda que não dão ênfase em outras matérias mais importantes como economia doméstica, pequenos consertos domésticos, discussão política, conceitos básicos de culinária, musica, artes...
Isso é bastante importante para a vida em geral, que deveria ser aprendida na escola e não numa situação de emergência ou quando se busca ter cultura.

Natália disse...

Entendi @V.
É, aqui no Brasil a coisa vai mal. Muito mal. Tenho dito.

montagna disse...

Mas basta eu virar as costas e o negócio pega fogo por aqui...

Em breve, novos posts...