quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Por que a coisa vai mal - Parte III

Os cientistas, professores, técnicos, inclusive os comuns, todos têm uma paranóia por ouvir a opinião de um especialista. Afinal de contas, o especialista sabe muito de um dado assunto, e dele deve surgir a opinião mais relevante sobre esse assunto. Mas, ultimamente tenho me queixado de um fato inegável e infeliz: decidi ser especialista numa coisa que todo mundo se acha especialista, dar aulas. 

Trabalho com pesquisa em ensino de ciências, dentre outras coisas. E quanto mais estudo, mais vejo que ensinar, estruturar cursos e aulas, e toda a preparação pedagógica, não é simplesmente saber montar bons slides e falar bem na frente de pessoas. Na verdade, qualquer elemento componente de uma aula deve ser milimetricamente pensado e planejado para que as coisas dêem certo. Mas sabemos que a coisa não funciona assim. Para a maioria, basta ter um conteúdo aprofundado, uma boa sequência (que os livros se encarregam de oferecer), e sentar o pau nos alunos - afinal de contas, não se deve dar moleza pra aluno. Essa visão é a coisa mais retrógrada, ultrapassada e medieval possível, na medida em que coloca no centro da questão o conteúdo, e não o aluno. Só que a informação muda ao longo do tempo. E o aluno deve ser ensinado a como lidar com a velocidade dessas mudanças.

Cá estava eu lendo essa notícia (neste link aqui) e me pus a pensar na infelicidade dos nossos alunos quando entram no ensino superior. Eles se deparam com a estrutura mais careta, reacionária e engessada possível - aquela mantida arduamentre pelos dinossauros. Não vou me estender muito na crítica, pois ela não é meu foco. Meu foco é mostrar a alternativa. E mostro duas. A primeira, dividida em duas partes, de Sir Ken Robinson, em duas palestras divertidas e contundentes no bom e velho TED. A segunda, num videozinho curto produzido por alunos de uma turma de sociologia da Kansas State University - coisa primorosa e avassaladora sobre a mentalidade medieval da universidade atualmente. TED com legendas, o outro, apesar de ser em inglês, não requer grande domínio da língua. Ambos valem muito a pena. E ambos mostram muito bem por que a coisa vai mal.

 





23 comentários:

farmacéptica disse...

Muito de passagem me ocorre no tocante à Farmácia (mas que se aplica a qualquer curso):

As instituições estão formando Compêndios de farmacologia ao invés de farmacêuticos. Enciclopédias ambulantes (tô viajando?) que não pensam, não criticam e que são incapazes de contestar (diferente de resmungar)qualquer coisa que vá além das suas notinhas estúpidas.

montagna disse...

E poderia ser diferente? Estímulo e resposta. Os alunos fazem nada mais do que reagir ao estímulo. Mude os estímulos e as reações mudam. Mas, pra ser honesto, eu não sei onde vc estuda e do que efetivamente está falando.

Anônimo disse...

O lugar não importa efetivamente, mas falo de uma tradição educacional em se exigir "decorebas" infinitas para "passar" de ano... Enfim, assunto batido...
E sim, os alunos respondem ao estímulo. E sim, poderia ser diferente, porque alunos não são ratos condicionados (muito embora, suas atitudes às vezes deixem uma certa dúvida... rsrs) e em sendo assim, podem reagir segundo seus próprios estímulos. Mas reconheço que a minoria irá reagir desta forma.

GaArini disse...

Bom, antes demais nada: TED é foda! Quanto ao dizeres de Ken Robinson, ele me trouxe uma linha de raciocínio que nunca tinha me dado conta e que no fundo é o grande indicativo, senão o ponto chave, do "Por que a coisa vai mal", que é justamente o fato de nossa criatividade, quanto seres humanos, estar sendo minada a tal ponto que que nossas mentes não mais pensam, apenas captam, registram, repassam e executam. O pensamento científico, humanista, enfim, seja qual for, quando tomado da forma que é visto agora (técnica, maquinal, pragmática, enfim adotem a definição que melhor lhes parecer), traz, como o próprio autor manifesta: uma exploração das mentes em busca de um recurso específico que no futuro não servirá de nada. Nesse ponto, vejo o sistema educacional como algo auto-destrutivo, logo como então promover essa ecologia humana, para reconstruir nossa capacidade a criatividade e questionadora?

Anônimo disse...

Boa pergunta, GaArini. Infelizmente, acho que não viveremos o suficiente pra ver a capacidade criativa e o ímpeto questionador serem reconstruídos. Quem algum dia teve,continua tendo e quem não, não.
Pelo menos é o que me parece.
Pra quem questiona e pensa nossas escolas e faculdades são um martírio. Mas o modo como vão contempla o "grosso" da população estudantil. "Fagocitose" de informação... Entra fácil... e dura o tempo de ser "vomitada" naquele documento a que chamam "avaliação".
E assim vai...

PS: será que alguém tem uma idéia mais positiva a respeito?

Anônimo disse...

@M.
Esse ano tem aquela feira livros da USP?

GaArini disse...

Bom, concordo contigo Farmacéptica, que não veremos essa mudança, porém como o próprio Ken Robinson cita, nós devemos ser os precursores de tal mudança, porém o que mais me chama atenção, em seu discurso, é o fato dele falar em revolução. Concordo com ele que essa revolução educacional é necessária, ainda mais em uma sociedade cujo processo de "massificação", por assim dizer, tem se tornado algo realmente preocupante, onde cada vez mais nota-se uma crescente alienação, que em combinação com esse sistema educacional acaba por gerar um todo auto-destrutivo e perigoso, porém como promover tal revolução, se mesmo nas universidades (o local mais propício para isso), ainda se observa enraizado velhos modelos educacionais e ainda tamanha vaidade por parte de docentes que se dizem "Semi-Deuses"? Em meio a isso, como é possível estabelecer tal mudança?

Anônimo disse...

@GaArini
Gostaria de ter um a resposta pra essa pergunta, mas na real uma mudança de fato, uma mudança estrutural, não acho possível.
Mas acredito em passos pequenos, em atitudes individuais. Em não deixarmos sufocar em nós este olhar diferenciado, por mais repressora que seja a estrutura "educacional" (entre aspas, porque a isso que chamam educação eu chamo MASSIFICAÇÃO).
Discussões como esta são possibilidades. Acho que a iniciativa de um professor de Metodologia da Investigação Científica em manter este blog é um modo de promover tal mudança.
Ser professor, por opção, é uma maneira de não deixar morrer isso tudo.

GaArini disse...

@Farmacéptica
Nesse ponto, mais uma vez, concordo contigo! Pois tenho bem alicerçado essa idéia de que tudo começa com pequenas atitudes e de forma individual. Há um dizer muito antigo, que diz: "As palavras cativam, mas só o exemplo arrasta" e isso tenho convicto de que o blog, e seus criadores, são um excelente exemplo disso!

GaArini disse...
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montagna disse...

Putz... estive fora muitos dias. O papo aqui foi bom, e eu perdi.

@F.
Já foi a feira de livros. Estava insuportavelmente cheia. Mas tinha coisa boa, bem mais que nos útlimos três anos.

@GA
a coisa tá feia mesmo... mas relaxa, ainda tem muito espaço pra piorar. Meu alento? Quanto melhor eu sou, mais sou necessário num mundo cheio de pangarés. Em sum: seja foda no que vc fizer que sempre haverá um lugar pra vc se enfiar.

Anônimo disse...

@M.
Puxa, o acontecimento do ano não mereceu um post!!?
Mas tudo bem, também estou insuportavelmente atarefada.
...mas bem que eu queria torrar algum dinheiro lá esse ano =(
Comprou muita coisa?

V. disse...

@F.
Eu fui na feira do livro e estava bem legal, porem se procurava algo mais pra Bio tinha que suar muito pra achar algo interessante. A feira esta cada vez mais voltada pra humanas, mas ainda não deixa de ser muito boa. =)

farmacéptica disse...

Mas é humanas mesmo que eu quero!!!
Filosofia sobretudo. Já tem Bio demais na minha vida... minha mente precisa de outras coisas pra arejar!

GaArini disse...

@montagna
As coisas estão realmente piorando, mas como me disse um grande mestre uma vez: "Sou feio, pobre e moro longe", logo vamos fazer nosso melhor pra ver se assim a coisa anda!

@farmaceptica
Também perdi a feira de livros e, também, estou buscando algo pra arejar a cabeça, assim pretendo ler o grande Carl Sagan! Muito bom mesmo!

montagna disse...

@F.
sempre vale um post. Mas deu tempo? Um dia chego lá e a coisa tá instalada...

@GA
Estou lendo Ernst Mayr... coisa linda!!!

@V.
Tinha muita coisa boa, mas nada técnico. Por exemplo, os livros do Mayr (Cia das Letras) e os da EdUNESP... ótimos!!! Em breve umas resenhas.

V. disse...

@M.
Ah tinha uns livros da Unifesp mas não me interessei por que como disse não eram muito técnicos. Mas achei um livro de orgânica incrível da Átomo. Esperamos pelas resenhas.

@F.
Bom se procurava humanas perdeu umas das melhores feiras q já vi. Valeu a pena mesmo, tinha muita gente e precisava de bastante disposição pra escolher tantos livros que estivessem dentro do orçamento. hehehe
Eu recebo um e-mail de uma editora avisando quando será a feira na usp, foi assim q descobri. Se quiser posso avisar quando será no ano q vem. =)

GaArini disse...

@Montagna
Caramba, o pouco que li sobre o que ele escreve já atiçou a curiosidade, e muito! Será que já é possível encontrar o: "What Makes Biology Unique?" traduzido?